8 de janeiro de 2016: parecer sobre a prova nacional de 4.º ano, solicitado pela AR

Exmo Sr. Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura,
Deputado Alexandre Quintanilha

Em resposta ao v/ofício n.º 38/8.º-CEC/2015, remetemos o seguinte parecer sobre o Projeto de Lei n.º37/XIII/1.ª/BE e o Projeto de Lei 44/XIII/PCP
As provas nacionais de Português e de Matemática, destinadas aos alunos em final de 1.º ciclo e, posteriormente, a inclusão de provas de Inglês para o mesmo nível de escolaridade, foram medidas recentes e, relativamente às mesmas, ouvidos elementos da comunidade educativa – professores e pais – podemos proceder ao seguinte balanço:
– a introdução das provas nacionais gerou, nas escolas e agrupamentos, alterações no funcionamento global e na organização do trabalho letivo diário, traduzindo-se tais mudanças em interrupções no decorrer das atividades letivas, a afetar anos de escolaridade não abrangidos pelas referidas provas, muitos deles pertencentes a outros ciclos de ensino dado que os alunos do 4.º ano têm vindo a efetuar as provas em sede de agrupamento, o que mobilizou espaços e recursos humanos , ou seja, a medida conduziu a salas de aula ocupadas, a aulas não concretizadas e a docentes indigitados para a vigilância, com a consequente interrupção na rotina letiva da maioria de alunos e professores;
– a prática letiva mudou para o 4.º ano de escolaridade, sendo as disciplinas de Português e de Matemática as visadas . Matérias como o Estudo do Meio ficaram relegadas para plano secundário, dado o 1.º ciclo funcionar em regime de monodocência : sabe-se que, em anos de avaliação nacional , grande parte das aulas se traduzem em momentos de treino para a prova, dedicando-se momentos consideráveis à resolução de testes similares ao modelo anteriormente aplicado, o que retira tempo para aprofundamento de conhecimentos não menos importantes a aprofundar, mais do que memorizar, é fundamental a aquisição gradual de competências para a vida;
– a medida de recuperação/apoio destinada a alunos sem sucesso na primeira fase da prova nacional, a funcionar nos dois meses subsequentes à data da primeira fase, revelou-se pouco eficaz – questiona-se um apoio de dois meses a alunos que revelam dificuldades específicas, o aconselhado será a escola poder facultar apoio ao longo do ano letivo, pois o importante é a superação de dificuldades, não o momento específico de atingir uma classificação numa única prova;
– cientes do facto de o peso de 30% da classificação das provas pouco poder afetar a classificação final, há que não descurar a pressão exterior exercida, como consequência de uma mera divulgação geral das classificações, os designados rankings das escolas, cuja seriação descura as variáveis de contexto apresentando, à opinião pública, uma imagem pouco objetiva da realidade nacional e ainda menos da de cada estabelecimento em particular.
Não sendo nossa intenção a defesa de facilitismo será, decerto, importante, encontrar alternativas para os alunos que concluem o 1.º ciclo do ensino básico.
Nesse sentido, defende-se que, nesta fase do percurso escolar, sejam aplicadas provas de aferição às diversas disciplinas estudadas ao longo do 1.º ciclo. As provas deverão ser realizadas a nível nacional tornando-se, obrigatoriamente, objeto de análise cuidada em cada escola, a fim de , a partir dos resultados , serem construídas estratégias destinadas à superação de eventuais dificuldades. As estratégias definidas deverão ser , de modo sistemático, avaliadas e redefinidas, sempre que necessário.

No intuito de tornar mais objetiva a matéria em causa , a questão das provas nacionais deveria ser alvo de um debate público por parte da comunidade educativa, com representação em associações e diversos organismos ligados à educação, não no mero intuito de se posicionarem contra ou a favor das provas mas, mais do que isso, na atitude de serem debatidas soluções e alternativas que possam contribuir para um carácter de estabilidade , dado as constantes mudanças relativas a modalidades de avaliação poderem lesar , em primeira e última instância, os alunos.
Reitera-se ainda a preocupação relativa ao efeito nefasto dos rankings que, como se sabe, não são diretamente proporcionais à construção de melhores práticas. Tal seriação deverá essencialmente servir para um estudo aprofundado da realidade em cada estabelecimento, em cada agrupamento, seguindo-se a respetiva análise dos pontos mais e menos fortes que os caracterizam. Só dessa prática se poderá partir para a construção de uma escola tendente a esbater as diferenças e não para uma escola meramente competitiva.
Concluindo com uma síntese acerca do anteriormente afirmado, defendemos que o normal funcionamento do ano letivo não deverá ser afetado, os apoios pedagógicos , no caso particular, a alunos do 1.º ciclo, não se deverão cingir a dois meses no final do ano letivo e as provas de aferição aplicadas a todos os discentes em final de ciclo, sem o “ruído” dos rankings enquanto mera seriação a convidar a um espírito competitivo e à consagração e/ou condenação de escolas por parte de cidadão menos informados, constituem-se enquanto alternativa válida.

A presidente da Associação de Professores de Português:

Edviges Antunes Ferreira
Lisboa, 8 de janeiro de 2016