Citação da semana – 20.dez.24

Citação da semana – Regina Duarte

«Contra todas as previsões catastrofistas, a leitura tem ressurgido entre as gerações mais novas. Na era digital, dominada por tempos de atenção cada vez mais curtos, seria natural pressupor o declínio de atividades que exigem imersão e foco, como é o caso da leitura. Paradoxalmente, jovens habituados a um ecossistema de vídeos de 30 segundos têm demonstrado um interesse crescente pelos livros. O fenómeno é tal que muitos dos títulos partilhados nestas plataformas se tornam imediatamente êxitos de vendas, com milhões de exemplares vendidos em todo o mundo. O mercado livreiro em Portugal tem conhecido fenómenos equiparados.

Os números falam por si: em 2022, os títulos mais populares no BookTok registaram aumentos de vendas expressivos, com alguns editores a reportarem taxas de crescimento de até 40%, diretamente atribuídos à plataforma. Géneros populares com as narrativas românticas (Isto Acaba Aqui, de Colleen Hoover) ou as fantásticas (Trono de Vidro, de Sarah J. Mass) tornam-se rapidamente êxitos de vendas, enquanto jovens leitores, que afinal estão saturados de telas, manifestam uma clara preferência pelos livros físicos, associando-se a uma estética que valoriza o objeto literário — sublinhando-os, usando marcas coloridas, organizando-os por tamanhos e estilos gráficos.»

 

Regina Duarte (2024). Há uma resistência à leitura ou uma resistência da leitura?. Expresso em linha em 20 de dezembro de 2024.

 

Neste ensaio sobre o que se passa no mundo da leitura, a Comissária do PNL, autora da tese O ensino da literatura: nós e laços, acrescenta:

«A crítica a este fenómeno será talvez um pouco ociosa: passamos do lamento quase conformado de que os jovens não leem para a crítica um pouco mais complexa nas suas motivações, a da baixa qualidade dos livros promovidos. Só para discutir este ponto seria necessário um ensaio inteiro, mas talvez interesse acrescentar um facto à discussão: juntamente com estes bestsellers à escala mundial, reeditam-se clássicos, graças ao entusiasmo gerado nas plataformas, como Orgulho e Preconceito, de Jane Austen, 1984, de George Orwell, O Monte dos Vendavais, de Emily Brontë, O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald, Frankenstein, de Mary Shelley, O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde, ou Mataram a Cotovia, de Harper Lee. Este diálogo entre o clássico e o «viral» redefine as fronteiras entre tradição e inovação, mostrando que o caminho da leitura de literatura pode ser mais inclusivo e dinâmico do que os críticos mais conservadores poderiam supor.

Podemos aceitar as premissas de que ler qualquer livro é melhor do que não ler, e de que ler muito, mesmo que literatura «fácil», possa ser um portal para outras leituras. Mas caso não as aceitemos, temos certamente de concordar que os conceitos de clássico e «viral» na mesma frase são um dos fenómenos mais surpreendentes do mundo literário dos últimos anos.»

 

 

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