«Havia no Brasil, entre 2000 e 2015, um programa de tevê chamado Provocações, conduzido por Antônio Abujamra. Repito a você uma de suas perguntas icônicas: o que é a vida?
A vida, para mim, é uma atitude, um tónus, uma abertura. Disponibilidade. É, gloriosamente, algo que nunca se deixará prender numa definição, o que já diz muito sobre este meu esforço de a definir. Isso tem a ver com a centralidade do movimento e do fluxo, das dinâmicas de aprendizagem que estão sempre a pô-la em jogo e a ampliar o próprio conceito de vida. Ou seja, a vida é aquilo que a gente sente que a vida é a cada momento e, no instante seguinte, isso já mudou. E essa outra coisa também é a vida, e a coisa que vem depois dessa e depois dessa, e que não nega as anteriores — deve expandi-las. Cultivo o mistério e a curiosidade. Saber sempre que não sei o que a vida é, o que significa tudo isto, vimos e vamos para onde, tem algum propósito todo este sofrimento? Há dias que me ocorrem algumas hipóteses organizadoras: “é tudo aprendizagem”, por exemplo. Mas logo a seguir essa certeza rui, e é esse movimento de ruir e reconstruir, essa epifania sempre renovada, essa dança, que no fundo é a Vida.
Se tivesse de escolher uma frase com apenas três palavras para a sua lápide, qual seria?
Dei meu melhor!»
Joana Bértholo (2024). No centro do humano. Rascunho em linha, edição 287, março de 2024.
A escritora Joana Bértholo, autora de Ecologia e Natureza Humana, entre muitas outras obras, do ensaio ao conto, passando pela dramaturgia e pelos roteiros cinematográficos – com exceção da poesia: “Só não toco na poesia, não me atrevo, tudo o resto apetece-me muito explorar”, diz –, será a primeira autora que vai iniciar o projeto da Rede de Leituras, dedicado a livros e a pessoas que os amam e cujo objetivo é dar a conhecer melhor autores que escrevem em português e convidar os nossos leitores a lerem os seus livros, tomando como ponto de partida uma das últimas obras publicadas.
Esteja atenta(o): a Rede de Leituras vai começar brevemente, no dia 11 de março, e principiar com uma autora pareceu-nos importante (o cânone literário, em particular aquele que é estudado pelos alunos do básico e do secundário, é quase exclusivamente um cânone masculino), e a qualidade e diversidade da obra de Joana Bértholo representam bem, até numa dimensão filosófica, o poder e a originalidade da literatura como arte que nos desafia a pensar (acerca do mundo e da nossa vida).
Fonte da imagem e página da autora aqui.