Citação da semana – 5.dez.25

Citação da semana – Hisham Matar

«Este romance [Os Meus Amigos] é profundamente marcado pelo exílio. Enquanto escritor, o que lhe interessa neste tema?
Há um problema com a palavra. A palavra tornou-se demasiado adocicada no sentido romântico, ao ponto de já não ter a eficácia que precisamos. À medida que isso aconteceu com a palavra, a experiência real tornou-se tudo menos romântica, tornou-se bastante pertinente e urgente. Hoje em dia, muitas pessoas passam por uma experiência de exílio, no sentido mais óbvio de estarem deslocadas das suas casas devido a guerras, catástrofes ambientais, conflitos económicos… Mas mesmo os que entre nós não saíram de casa, que permaneceram no mesmo lugar — rodeados pelas mesmas pessoas — experimentaram alguma coisa muito idêntica a uma cultura de exílio, uma vez que tudo se tornou menos seguro e estável.

A literatura sempre foi fascinada pelo exílio, mas consciente de que, em especial se pertencemos à tradição abraâmica, a nossa imaginação e a nossa ligação às histórias são influenciadas pela mãe de todas as histórias, a de Adão e Eva e do seu deslocamento. Não apenas quando são expulsos do paraíso, mas também quando os primeiros retratos deles no paraíso são retratos de exilados. Ou seja, a literatura tem reflectido sobre essa coisa fascinante que é a distância entre o nosso sentimento mais íntimo de nós mesmos e do que nos rodeia e o facto de que, por vezes, essas duas coisas se correspondem, Mas também, na maior parte das vezes, no facto de que qualquer um de nós, independentemente de quão afortunada ou estável seja a nossa vida, está sempre a negociar entre a experiência pessoal e a do meio que nos envolve.»

Hisham Matar (2025). Hisham Matar: “A literatura é mais importante do que a política”. Público em linha, 6 de setembro de 2025.

 

Excerto da entrevista:


«Uma das coisas que a amizade promete é o alívio do sofrimento, incluindo o exílio. E é um antídoto maravilhoso para o exílio quando, de repente, conhecemos alguém e reconhecemos nela uma alma gémea. É realmente muito forte. E acho que essa é uma das suas ligações com o exílio. Exílio no sentido mais amplo, no sentido que eu quis dizer inicialmente, não apenas estar longe de casa mas sentir-se deslocado. E, da mesma forma, mesmo em boas amizades, quando sentimos que o nosso amigo não nos compreende, ou sentimos que não o compreendemos, ou não estamos em sintonia, ou quando, por alguma razão, se perdeu o sincronismo entre as nossas vidas, pode parecer um momento de exílio, que estamos deslocados. Se pensarmos nas várias histórias que conhecemos sobre política, a amizade está sempre presente. Isso é um facto curioso, porque a amizade, na sua melhor forma, é promíscua. Ela não prospera sob um ditame. A pior maneira de sermos amigos é se fizermos uma lista do tipo de amigos que seremos uns para os outros… Isso acabaria com a amizade, certo? Por outras palavras, acho que reconhecemos que uma das coisas que precisamos dos nossos amigos é um espaço de experimentação; é descobrir o que podemos fazer juntos e que tipo de pessoas seremos, porque reconhecemos, em algum nível, que existem múltiplas formas de ser, que não somos constantemente constantes. E isso parece ir completamente contra qualquer tipo de projecto interessado em impor poder. A amizade, na sua essência, mesmo nas amizades mais casuais, contém uma grande possibilidade de rebelião. Rebelião contra sistemas, contra expectativas. Estou a falar de um certo tipo de amizade, talvez esteja a falar do melhor tipo de amizade, mas acho que dentro da sociabilidade exigida pela amizade há muitas correspondências semelhantes às da vida política ou ao contrato que é feito entre o Estado e nós.»

 

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