As ações que a DGE está a desenhar, e que vão estar acreditadas e creditadas pelo Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua (CCPFC), consideram prioritária, entre outras, a formação científica e pedagógica no âmbito das diversas disciplinas dos ensinos básico e secundário.
Como essa formação científica e pedagógica, que se destina a professores de todos os ciclos, deve refletir os resultados de um levantamento de necessidades, houve várias reuniões de trabalho entre a DGE e as associações de professores, sociedades científicas e os centros de formação de associação de escolas, de modo a serem definidas, num primeiro momento, as áreas prioritárias a que essa formação deve responder, tendo em conta, em particular, as dificuldades e os problemas que os alunos têm revelado, de forma persistente, nos últimos anos, e que se manifestam, no caso do Português, de forma resiliente (porque ‘resistem’ ao trabalho que muitas escolas fazem), nos resultados da avaliação externa (exames nacionais, provas de final de ciclo, provas de aferição), em estudos nacionais, como os que revelam as práticas de leitura dos estudantes dos ensinos básico e secundário, e nos estudos internacionais, como é o caso dos mais recentes PISA e PIRLS.
É essa reflexão que apresentamos a seguir e que partilhamos, de forma prioritária, com os sócios da Associação de Professores de Português, uma vez que tudo o que pudermos fazer para levar os nossos alunos a lerem mais e melhor – e a escreverem com mais correção, clareza, criatividade e qualidade – será obviamente prioritário.
Áreas prioritárias de formação dos professores de Português
Português Língua Não Materna
Didáticas específicas na língua não materna, em diferentes domínios (oralidade, leitura, escrita e interação cultural seriam os mais importantes).
Ter em conta os recursos escassos, desatualizados e nem sempre com qualidade que estão disponíveis para os professores criarem experiências de aprendizagem e responderem às dificuldades dos alunos que têm línguas maternas muito diferentes.
Ter em conta, ainda, que muitos professores de PLNM não têm formação em didática específica dessa disciplina, de haver escassez de recursos e materiais, de muitas vezes o trabalho realizado não ter em conta o perfil sociolinguístico e escolar dos alunos imigrantes e de as escolas não terem autonomia suficiente para lidarem com esta situação complexa, que exigiria, em muitos casos, que os alunos recém-chegados tivessem uma imersão prolongada (de pelo menos um semestre) em língua portuguesa.
Complementarmente, seria importante garantir que todos os alunos estrangeiros tivessem aulas de Português Língua Não Materna, mesmo no caso dos agrupamentos ou escolas não agrupadas que têm um número de alunos inferior a 10, o que atualmente inviabiliza a abertura de uma turma de PLNM.
Português
Consciência fonológica, dicção e comunicação (no pré-escolar).
Iniciação à leitura e à escrita (no 1.º ciclo).
Consolidação das competências de leitura e de escrita, no 1.º ciclo, sobretudo tendo em conta o desenvolvimento cognitivo das crianças e uma formação menos robusta no pré-escolar.
Em todos os ciclos:
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- Fluência e criação de rotinas de leitura.
- Compreensão da leitura, nomeadamente de textos longos e muito longos, com a realização de inferências e interpretação de elementos implícitos num texto.
- Escrita criativa e de acordo com vários géneros e modelos.
- Planificação, revisão e aperfeiçoamento de um texto escrito.
- Dificuldades na aprendizagem da leitura e da escrita.
- Reforço da literacia de leitura nos ciclos cujos alunos ainda foram afetados pela pandemia (sobretudo, o 2.º e o 3.º).
- Reforço das aprendizagens, sobretudo de leitura e escrita, com atividades, tarefas e experiências de aprendizagem que mobilizem competências de maior complexidade cognitiva (por ex., informação implícita num texto, reconstituir relações lógicas, mobilizar informação implícita ou explícita em dois ou mais textos, analisar relações de conteúdo entre textos de diferentes géneros, avaliar um texto ou a adequação da sua linguagem, tendo em conta a sua finalidade ou a sua construção), genericamente insistindo em criar inferências, analisar (criticamente), comparar, estabelecer relações, criar – em vez de ‘transmissão de conteúdos’ e exercícios mais ou menos rotineiros, nos diferentes domínios do Português.
- Foco no ensino e na aprendizagem da gramática, enquanto domínio curricular de diálogo entre a frase e o texto e prática de mobilização do conhecimento explícito da língua no desenvolvimento das competências de leitura, escrita e oralidade.
- Didáticas especificamente desenhadas para as escolas que revelam tipicamente dificuldade em lidar com os problemas de aprendizagem dos alunos que ficam retidos nalgum ano letivo (o que se revela paradigmaticamente nos resultados do estudo internacional PISA ao longo dos anos), dos alunos que têm medidas multinível seletivas ou adicionais ou que não falam a língua de escolarização.
- Em particular, estudar modelos didáticos e organizativos que garantam a continuidade e robustez das aprendizagens nos percursos individuais e evitem os problemas inúteis causados pela retenção de ano, nomeadamente recorrendo a exemplos do que se faz em vários países para enfrentar a diversidades de ritmos e desempenhos escolares. Esta questão abrange tanto os referidos alunos retidos como os que ‘passam sem saber’.
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Observações
As áreas prioritárias propostas tiveram em conta o histórico das respostas dos professores de Português, ao longo dos anos, em ações de formação, jornadas e encontros dinamizados pela Associação de Professores de Português.
As formações que forem desenhadas devem ter em conta uma necessária formação científica robusta e atualizada – e o facto de haver professores no sistema educativo que fizeram a sua formação inicial noutros sistemas educativos (Brasil, Angola, S. Tomé…).
As áreas prioritárias devem privilegiar competências mais complexas e os níveis cognitivos de desempenho mais elevados, que estão previstos nos atuais documentos de referência curricular, nomeadamente no Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória.
As áreas prioritárias devem prever um acompanhamento mais sistemático dos professores do 1.º ciclo, cuja formação em didática da leitura e da escrita está, frequentemente, desatualizada (muitas vezes, porque os professores privilegiam a formação contínua noutras áreas, tipicamente mais ‘próximas’ da sua área de formação inicial).
O recurso a ferramentas e plataformas digitais para a Direção-Geral da Educação (DGE) poder auscultar diretamente os professores dos diferentes ciclos (sobre áreas de formação prioritárias) seria uma mais-valia, de modo a haver respostas mais representativas do universo dos docentes (e aprofundando o conhecimento que podemos ter por amostra, por muito representativa que seja – e a da APP é historicamente bastante representativa, por envolver milhares de professores em formação ao longo dos anos).
Lisboa, 12 de março de 2024
Direção da Associação de Professores de Português
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