As principais questões, preocupações e aspetos positivos colocados com esta mudança podem ser agrupados em questões pedagógico-didáticas e questões técnicas, nomeadamente:
- Questões pedagógico-didáticas:
- A comparabilidade entre provas de diferentes anos permite encontrar um retorno formativo nas provas sumativas (de avaliação externa), uma vez que se torna possível estudar a resposta de diferentes ‘gerações de alunos’ (a taxa de acerto) a itens com níveis diferentes mas comparáveis de complexidade cognitiva.
- A tecnologia pode colocar limitações em competências específicas da disciplina de Português, tendo implicações ‘redutoras’ em ações estratégicas decisivas, como é o caso das técnicas de leitura de textos associadas a técnicas de escrita (sublinhados, esquemas, notas na margem…).
- Os textos apresentados nas provas devem poder ser sublinhados para que os alunos possam destacar a informação que considerarem pertinente e assim responderem melhor às questões apresentadas.
- A planificação da produção escrita num item de construção de resposta extensa exige papel e caneta – o que requer mais tempo para a sua realização (tendo em conta o tempo para depois o aluno digitar a textualização final no computador), ou o risco de a DAVE contribuir para incentivar a escrita de textos ‘não planificados’ e tendencialmente mais curtos.
- A perícia dos alunos com a tecnologia introduz (ou pode introduzir) uma desigualdade suplementar, que terá de ser compensada, em parte, com uma maior extensão do tempo de duração das provas.
- A exigência de mais tempo reforça a necessidade de a cotação dos itens não estar alocada ao tempo que os alunos demoram a responder (i.e., à dificuldade dos itens).
- O grau de dificuldade dos itens vai depender também da forma como os alunos respondem num paradigma ‘tecnológico’ diferente e esse aspeto deve ser tido em conta na conceção e elaboração de itens necessariamente diferentes.
- A proximidade ‘espacial’ entre textos e questões no enunciado da prova permitirá que os alunos não estejam sempre a mover as páginas do enunciado para cima e para baixo.
- A possibilidade de visualizar duas páginas lado a lado é uma vantagem em termos de leitura global (do texto ou enunciado) se o texto não ficar mais reduzido.
- Nos itens de construção, no caso de resposta restrita, devem ser privilegiados os exercícios lacunares com ‘janelas de resposta’ que apresentem várias hipóteses de solução, de modo a que o aluno apenas selecione a resposta correta e não tenha de a escrever, evitando-se, assim, as possíveis incorreções gráficas que dariam origem a respostas diferentes das soluções previstas.
- Deve continuar a haver versões diferentes da mesma prova no caso dos itens de seleção.
- O corretor ortográfico deve ser removido, de forma a poder ser avaliada a correção linguística em relação à ortografia.
- Como a correção linguística será necessariamente afetada por erros de digitação, os critérios de correção deverão prever uma tipologia de erros que tenha em conta esse tipo de ocorrências.
- Os critérios de correção do parâmetro de estrutura e coesão do discurso devem ter em conta que podem ocorrer falhas na pontuação por erros de digitação.
- A formação atempada de professores e alunos nos aspetos específicos da plataforma em que vão ser realizadas as provas e o conhecimento prévio das suas características (plataforma e provas) permitirá reduzir o efeito de surpresa que prejudica a validade da avaliação.
- As competências digitais da maior parte dos alunos não são satisfatórias para responder a vários tipos de questões e para escrever textos em linha – o que exige mais formação nesse tipo de literacia e que esse aspeto seja tido em conta na elaboração das provas e dos itens.
- A DAVE vai contribuir certamente para uma massificação da tecnologia em sala de aula e para uma perda de motricidade fina, o que poderá ser compensado com exercícios de ‘recuperação’.
- Os alunos das escolas que já generalizaram o recurso a tablets e computadores, em detrimento de cadernos e manuais, estão em vantagem ‘competitiva’ relativamente aos alunos de escolas mais tradicionais, o que cria certamente um enviesamento na equidade entre os alunos perante as provas em formato eletrónico.
- Questões técnicas
- Os computadores dos alunos podem não ser suficientes para a realização da DAVE a todo o universo de estudantes, por várias razões (avaria, falha técnica, autorização dos encarregados de educação…).
- Deve ser garantida a equidade no acesso aos equipamentos – alguns alunos podem trazer computadores com características diferentes que tornam o processo de resposta mais rápido, introduzindo uma desigualdade suplementar no tempo de realização da prova.
- Todos os computadores devem ser compatíveis com as características das provas das várias disciplinas.
- Não é claro se as provas serão realizadas em linha em tempo real ou offine. (i) No caso de serem em linha em tempo real, deve ser tida em conta a largura de banda da rede de acesso em todas as salas, de modo a que a plataforma não fique lenta ao ponto de os alunos não conseguirem avançar para uma questão seguinte. (ii) Ainda no caso de serem em linha em tempo real, deverá ficar garantida a desativação do acesso à pesquisa de respostas na internet.
- Deve ser garantido o acesso fácil a carregadores de bateria, de modo a que a durabilidade das mesmas (menor em equipamentos mais antigos) não prejudique nenhum aluno.
- Devem ser garantidos equipamentos de recurso: computadores, cabos, carregadores de bateria, tomadas.
- Devem ser garantidos técnicos de apoio em número suficiente para ajudar nas dificuldades que possam ocorrer em salas diferentes ao mesmo tempo.
- O número de salas necessárias para a realização das provas será tipicamente maior, uma vez que é preciso acomodar e distanciar mais o equipamento dos alunos – ou criar barreiras visuais para os alunos não verem os ecrãs uns dos outros.
Em suma, e tendo em conta os aspetos anteriormente apontados, parece-nos que a DAVE reforça uma inevitável mudança de objetivos nas provas de avaliação externa – servirem mais para aferir o sistema do que para certificarem a conclusão de um determinado ciclo de estudos –, contribuindo, desse modo, para a qualidade, eficácia e eficiência do sistema educativo, se as dúvidas e preocupações indicadas neste documento puderem ser respondidas.
Lisboa, 14 de novembro de 2022
A direção da APP
Fonte da imagem aqui.